FIRE Jovem - Princípio 6: Dinheiro em Caixa

21 de maio de 2020

Olá, senhoras e senhores

Hoje vou explicar porque ter dinheiro em caixa faz sentido mim. Este post é baseado nos 7 princípios que uso para guiar os meus investimentos, e este é o princípio 6:

"Possuir dinheiro em caixa para aproveitar as promoções do mercado."

O tal do Caixa

Ou seja: quando mercado estiver barato com ações a preços descontados os retornos esperados para o futuro são maiores, o Caixa é uma forma de aproveitar estes momentos. Nesse cenário de 'promoção' pode ser muito interessante ter uma parte do patrimônio depositada em ativos de baixo risco e alta liquidez para comprar as ações, FIIs ou quaisquer ativos que estejam baratos.

1. Reserva de Oportunidade

Vou exemplificar a importância do Caixa (e da falta de paciência) em uma situação recente pela qual eu e muitos outros passamos: no sangrento mês de março, logo após o carnaval, a bolsa brasileira caiu com muita força seguindo a tendência das bolsas pelo mundo. A Bovespa saiu dos 107 mil pontos em 4 de março e bateu em 63 mil em 23 de março, uma queda rápida e brutal de mais de 40% em poucos dias. Sem dúvidas foi uma experiência ótima para aprendermos o que é uma pancada pra baixo. Foram 6 circuit breakers em poucas semanas.

O investidor pode olhar essa situação de algumas formas diferentes, variando do completo desespero a uma grande euforia pelos preços descontados. A realidade, como nos ensina a história, mora em algum ponto entre os extremos. Tomemos o meu exemplo: sou um investidor de longo prazo que busca escolher empresas de qualidade com boas perspectivas para o futuro, a minha visão durante estes tempos era a seguinte: cautela e aproveitamento das oportunidades de longo prazo. Ou seja: era óbvio que a queda das ações não era a toa, o mercado estava precificando a queda do lucro das empresas no curto-médio prazo (somado às péssimas condições políticas do Brasil, provavelmente) e por isso os preços caíram.

A grande questão é a seguinte: sim, os lucros das empresas irão cair no curto-médio prazo, mas se eu tenho razões para acreditar que a empresa pode retornar, no médio-longo prazo, ao patamar de lucros do último ano (e, consequentemente, a um preço semelhante àquele antes do coronavírus) faz todo sentido comprar a ação (de maneira responsável) para o futuro. É sempre bom comprar boas empresas, mas quando o potencial de ganho delas fica ainda maior é interessante aportar mais do que em uma situação normal, pois o potencial de valorização futura é maior que era até então.

Vamos usar a Energias do Brasil (ENBR) como exemplo: é uma small cap do setor elétrico com bons resultados no mercado, lucros consistentes, boa governança, dívidas equilibradas, boas perspectivas futuras com novos investimentos e tudo mais, ou seja, é uma empresa que é interessante ter na carteira. Vamos analisar o que aconteceu com a ENBR no últimos meses.

Variação do preço da ENBR3 nos últimos 5 anos

Notem que a ação saiu de R$23,08 no início de 2020 para R$ 14,33 no fundo atingido em 20 de março (aproximadamente 30% de queda), chegando aos patamares do início de 2019. Uma coisa é fato: os lucros da ENBR provavelmente irão cair nos próximos trimestres com a redução na demanda por energia elétrica, uma vez que a empresa tem a distribuição como uma das principais fontes de receita, mas se eu acredito que a empresa tem capacidade de aguentar este período de baixa e que ela poderá voltar aos patamares de lucro dos últimos anos, eu deveria enxergar essa queda como uma oportunidade de médio-longo prazo e aportar mais do que eu normalmente aportaria, porque a expectativa de retorno é maior.

E é aí que o Caixa entra nessa história toda, como eu vou aportar mais do que o normal se  (exemplo hipotético) eu tenho 30% do meu patrimônio em ações, 30% em FIIs, 20% no meu imóvel e o resto numa previdência que eu não posso colocar a mão? Me restam duas alternativas: vender algum patrimônio que já tenho (o que não é interessante, pois teoricamente os ativos em carteira são ativos que considero bons, além disso eu estaria vendendo em um péssimo momento) ou usar a reserva de emergência para aproveitar a oportunidade (o que é ainda pior, RE não é pra investimento). Aí está a importância do Caixa: ele é uma reserva de oportunidade para usar sem culpa quando uma oportunidade aparecer. Além disso ter caixa/reserva de oportunidade reduz a volatilidade da carteira, pois o caixa deve estar alocado em ativos de baixo risco que, no mínimo, não caem quando uma crise ocorre. O caixa é uma parte fundamental em uma carteira de longo prazo.

2. Modo de usar

Deixo aqui uma lição aprendida sobre como utilizar o caixa de forma correta. Como disse, a bolsa brasileira passou por SEIS circuit breakers em março, SEIS quedas de 10% ou mais com relação ao dia anterior. Mas isso nós sabemos agora, depois que a tempestade passou.

Comigo aconteceu da seguinte forma: logo depois do carnaval a bolsa caiu dos 116 mil pontos para os 102 mil, eu já vinha com a mentalidade de ter uma parte da carteira alocada em Caixa para aproveitar as oportunidades e queimei tudo de uma vez (podem ver os aportes feitos no mês aqui), mas o inocente aqui não imaginava a merda que estava por vir. É claro que o Caixa era pequeno e isso contribuiu para que a 'queima' fosse rápida, mas independente disso foi um erro e os erros estão aí pra gente aprender com eles.

Por isso, talvez mais importante do que ter caixa é saber quando usá-lo e quanto gastar na hora de usar. Existem algumas regrinhas simples que ajudam a evitar erros como o que eu cometi:

1. Nunca queimar todo o Caixa de uma vez.

2. Limitar os aportes em fatias do Caixa, por exemplo: aportar no máximo 50% do Caixa em uma queda.

3. Estabelecer espaços de tempo entre os aportes: nunca saberemos se uma queda ainda mais forte virá na próxima semana, então colocar um espaço de tempo mínimo entre os aportes pode ser interessante para controlar o viés psicológico de aportar sempre.

4. Obedeça as suas regras: nós, como seres humanos, estamos sujeitos aos mais diferentes vieses e sempre achamos que 'dessa vez vai ser diferente', mas não vai. As regras foram criadas por um motivo, siga-as.

3. Deixe o caixa crescer junto com seu patrimônio

Esse é um ponto importante. De nada adianta ter Caixa, ter uma oportunidade clara em vista se o aproveitamento for muito pequeno. O Caixa deve crescer junto com o patrimônio para que o aproveitamento das oportunidades no longo-médio prazo seja relevante. De nada adianta ter um Caixa de 10k se o patrimônio é de 1 milhão, o efeito do aproveitamento será muito pequeno comparado ao todo da carteira.

O ideal é definir um alvo de alocação e ir ajustando a carteira para que a fatia em Caixa fique próxima ao alvo, assim garante-se que o Caixa crescerá junto com o patrimônio. Vão haver épocas em que os outros ativos caem tanto que nem será necessário aportar, em contrapartida em outros momentos de bull market vai doer o coração ver as ações e FIIs subindo e o aporte ser direcionado ao Caixa.

E esse é um ponto que dói na hora de aportar, sei bem como é, toda vez que preciso destinar dinheiro pro Caixa é uma dor no coração, eu sei que poderia estar colocando a grana em ações ou FIIs com um retorno potencial maior. Mas esta é uma visão que não olha o todo, que se esquece que as crises chegam e as oportunidades aparecem. Tenho que obedecer as regras que criei, elas existem por um motivo. Atualmente defino minha parcela em caixa como 15% do patrimônio (e acho que está um pouco superdimensionado).

É bom lembrar que na hora de queimar o Caixa não se pode ter dó (desde que de forma consciente, seguindo as regras), o Caixa só tem sentido se for para aproveitamento das oportunidades, ele não tem fim em si mesmo, o retorno de longo-prazo para ativos de baixíssimo risco são muito menores do que os retornos dos demais ativos. Como diz Ray Dalio: "Cash is trash". O que quero dizer é: o caixa é uma reserva e não um investimento gerador de valor, as reservas devem ser usadas sempre que uma oportunidade aparecer e, depois de usadas, reconstruídas aos poucos.

4. Quais ativos servem como Caixa ?

Os pontos fundamentais para um ativo ser considerado Caixa são:

1. Liquidez: quando a oportunidade aparecer deve ser fácil de tirar a grana e investir, liquidez é fundamental, quanto mais líquido melhor.

2. Segurança: é bom que seja um investimento sólido e de baixo-risco, pois normalmente as oportunidades aparecem quando tudo está caindo e você não quer ver seu caixa minguando nesta hora.

Bons ativos para Caixa são: Tesouro SELIC, Fundos de Renda Fixa de alta liquidez, Contas correntes que rendem como CDI (Nubank, Inter) e CDBs de alta liquidez.

5. O Caixa não é só para o mercado financeiro

Apesar de estar falando das oportunidades do mercado financeiro, não é somente nele em que elas aparecem. É muito comum aparecerem oportunidades no setor imobiliário: uma família se mudando as pressas, um certo imóvel que está muito mais barato do que o valor real, etc, etc... Possuir caixa para aproveitar essas oportunidades irá, no mínimo, reduzir os custos de financiamento (quando não eliminar por completo a sua necessidade). Vira e mexe uma oportunidade aparece:
  • Abertura de negócio próprio
  • Comprar parte de outro negócio (sócio)
  • Imóveis
  • Bens a preços baratos (carros usados)
  • Leilões
Dizem que sorte é a combinação da oportunidade com o preparo, então permita-se estar preparado e reserve uma graninha no Caixa pra te chamarem de sortudo. E não é por nada não, mas conheço um senhorzinho americano que guarda um bom Caixa, talvez tenhamos algo a aprender com ele. Na verdade não que isso por si só justifique alguma coisa, mas é no mínimo um ponto de atenção.

Enfim, resumindo tudo:

PONTOS FORTES:
  • Reserva de oportunidade para aproveitar oportunidades
  • Reduz a volatilidade da carteira
  • Warren Buffet tem 
PONTOS FRACOS:
  • Menor potencial no longo-prazo (se mal usado)
  • Vai doer aportar no Caixa quando tudo estiver subindo
É isso, meu povo, espero que este texto ajude ajude-os a refletir sobre ter ou não ter uma reservinha de oportunidade na manga. Eu me permito estar preparado, e você o que acha ?

FIRE Jovem


4 comentários:

  1. Muito bom o post, legal, eu tenho reserva de oportunidade e concordo com várias ideias. Mas também sou fiel a estudos e tem alguns estudos que mostram que a reserva de oportunidade é falha e que vc investir todos os meses o dinheiro que você tem, no logo prazo, vale mais a pena do que reserva pra investir na queda (mesmo que vc fosse Deus e soubesse o fundo de todas as quedas). Já viu esse artigo? Qualquer coisa trago um debate dele pq queria fazer uns estudos em cima dele tb

    ResponderExcluir
  2. Olá, EI

    Eu já vi um artigo que compara o efeito na rentabilidade de aportar randomicamente todos os meses com um aporte na 'baixa do mês' e pelo que me lembro a diferença não era grande. Mas a questão é que a reserva de oportunidade é para períodos mais longos, seria algo como a diferença entre aportar (com mais intensidade) numa baixa de dois anos comparado aos aportes regulares, neste caso o efeito é bem relevante (não tenho certeza se é o mesmo artigo ao qual você se refere, caso eu esteja errado me corrija, por favor).

    Mas uma coisa é fato: nós nunca vamos conseguir prever o fundo, mas sempre é possível fazer uma análise histórica dos P/L para saber se estamos em um momento de bolsa 'cara' ou 'barata'. Nos EUA eles tem o indicador 'Shiller CAPE ratio' que é um P/L que leva em conta os últimos 10 anos do mercado de ações inteiro dos EUA, tem alguns artigos que mostram que esse é um bom indicador dos retornos futuros do mercado nos 10 anos que o seguintes. Aqui um link de um artigo falando sobre isso: https://www.vanguardcanada.ca/documents/forecasting-stock-returns.pdf

    Obrigado pelo comentário e pelo ponto levantado, sempre bom discutir esses assuntos.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Não é o mesmo estudo, mas acho que é parecido. O ponto desse estudo que falei era que nem mesmo sendo Deus e tendo dinheiro em caixa vale a pena guardar, mas eu não concordo muito com ele, sendo que nessa queda de março eu aportei quase toda minha reserva de oportunidade e sai feliz, fiz mais ou menos como você falou, eu tinha uma estratégia de "tiros" e a cada tanto que o ibov caia eu comprava. Chegou em um momento que eu já tinha aportado tanto (meu maior aporte em um mês inclusive, foi uns R$ 30.000) que eu quase zerei o caixa. Mas ai resolveram parar com a festa dos circuit breaks kkkkk

      Excluir
  3. Bom princípio, uma reserva de oportunidade é muito útil, a gente não é obrigado a pagar caro por algo só porque não tem nada barato no mercado, pelo menos não em ações, deixa em tesouro SELIC e aguarde, olho o WB quantos anos está esperando hehe tem gente já falando mal dele por isso, mas um dia sempre vem uma crise e daí ele vai as compras.

    Tendo uma estratégia e seguindo ela já é 99% do que precisa pra ter sucesso. O ruim é se você não tem certeza da sua estratégia, daí nessas horas começa mudar de ideia e fazer merda. Se sobreviver, depois de uns anos a gente cria a rotina e daí vai igual um robô, sem emoção nos investimentos.

    Gosto das dicas do Daniel Nigri, ele fez vários tiros durante a queda em Março, e ainda ficou com caixa caso caísse mais. Já o meu caso, não tinha dinheiro em caixa, acabei tirando um pouco do Tesouro SELIC pra aproveitar, mas desbalanceou minha carteira e agora estou repondo na renda fixa.

    Bem na verdade não estou mais tão focado em manter a carteira 100% balanceada 100% do tempo, estou desbalanceando um pouco propositadamente pra evitar fazer trocentas operações por ano.

    Abraços!

    ResponderExcluir



FIRE Jovem - Os Fundos de Gestão Ativa Brasileiros batem o Mercado? O Veredito - Parte III

  Olá, caros leitores, antes de mais nada peço que, caso não tenham visto, leiam os posts anteriores desta série. É importante lê-los para q...

Topo